Nascem na nossa cabeça não se sabe bem quando. Histórias sobre quem somos. Contadas, repetidas, somadas ao longo da vida. Solidificam uma imagem que nos é segura: somos assim e pronto. Nem vale a pena discutir. Mais confortável fica a caminhada. Mais pobre também.
Depois fazemos o mesmo ao próximo. Porque é também mais seguro saber com o que contar vindo de quem anda perto. Se acreditarem, melhor um pouco, estaremos também a contar o conto que acrescenta um ponto ao deles.
Vamo-nos emaranhando uns aos outros. Teias bem tecidas a limitar o potencial que realmente nos assiste. Regras, hábitos, crenças, repetidas até formatarem as possibilidades. Provando-se a si mesmas, nas evidências que escolhemos a dedo e gritamos ao mundo. Eu logo disse. Eu já sabia. É sempre a mesma coisa. Confortável. Quentinho. Morno, no mínimo.
E perguntamo-nos por que não há lufadas de ar fresco na vida. Perguntamo-nos por que será que é sempre tudo igual...
Paciência. Ao menos assim já sabemos o que podemos esperar. Fica tudo mais fácil. Tudo resolvido. Que tipo de pessoa és, que tipo de pessoa sou, este tipo é daquele tipo, e o outro é casado com uma tipa do tipo daquela outra. Tudo se tipifica, tudo se simplifica, tudo se estupidifica. Padrão seguro este que inventamos, medrosos da incerta natureza humana.
A segurança imobilizadora a solidificar quem sou, quem és, quem ele é. Armadilha subtil esta de querer controlar inventando o que não é, mas que acaba por ser, se todos acreditarmos muito. Tudo sossegado, tudo calmo, zero surpresas.
Exceto o facto de ser mentira. E que, mais tarde ou mais cedo, se desalinha a torre, desmoronando o que se pensava bem alicerçado. Que dissimulado, que falso, e não era que afinal era tudo aldrabice?
Dele? Ou minha? Nossa, certamente...
Gonçalo Gil Mata
(Foto: Baja California, MÉXICO)
Tipificar, rotular, padronizar, normalizar, estupidificar... não desabrochar, não criar, não harmonizar, não fluir, não viver...