Torres del Paines - Patagonia, CHILE
Que violentas são certas vagas da vida! Tudo partem, tudo quebram. Autênticos tsunamis de destruição. Tremem-nos as pernas, vai-se-nos o chão, cedem os alicerces que pensávamos serem o garante sólido de paz.
Nascem estas ondas por vezes do nada. Sem aviso. Sem preparação. Sem ensaio. E é de improviso que se faz a nossa reação ao terramoto. Intensas réplicas a povoar cá por dentro, uma e outra vez, quase parecendo não perder força, embora na verdade sempre vão abrandando.
Parte de nós quer reagir. Com igual violência. Mas esbarrando-se contra a sólida parede do que é. Do que simplesmente é - um labirinto de realidade que nos aprisiona. Um turbilhão de energia a querer que não seja. Um pânico de busca por alternativa do que não queremos aceitar, por nos acharmos incapazes de o assimilar.
Felizmente, esta reação inicial, esta fratura interna, este vulcão tamponado sem escapatória, este "não pode ser", sempre amaina. Mais rápido se o deixarmos em digestão sossegada. Mais lento se não aceitarmos a dor que existe no mundo.
Doer apenas dói. Só isso. E mesmo que muitíssimo, é só isso.
Quanto mais depressa deixarmos as núvens seguir o seu caminho, mais depressa veremos sol. Mais cedo integraremos os factos da realidade na nossa subjetividade. Mais claro fica o que devemos aceitar. Para que nem tanta energia se desperdice no que não podemos mudar. Nem em garantir que não volta a acontecer, porque às vezes volta.
Se nos libertarmos de sentir a raiva e a frustração e a injustiça divina de que sempre reclamamos, damos espaço a que o desassossego perca corda sozinho. Não o terminamos. Acaba-se-nos pelo corpo fora. Esvai-se discretamente como um fiapo de fumo de cigarro depois de algumas voltas no ar. Prossegue a sua viagem, depois de passar por nós, tendo-nos empurrado e sacudido com violência por um instante, mais um encontrão que um embalo, e finalmente some-se. Sem mais.
É justamente aqui, neste espaço em que o ruído mental abranda, em que vemos para lá da turbulência específica, em que espreitamos de cima a tempestade... é justamente nesse espaço de serenidade e silêncio interior que digerimos todo e qualquer impossível.
Gonçalo Gil Mata
Belo texto. Parabéns e obrigada por o partilhar.