Parada Leitão, PORTO
Às vezes os músculos precisam de não mandar. Os movimentos fazerem-se sozinhos, com vagar. Sentir-se o peso lento das passadas automáticas. Ombros tombados. Um sossego abatido, apático, quase inerte, navegando ao sabor da sorte. Mal empurrado. Mole, meio derretido, como um elefante sem vontade.
É uma sintonia natural. Um processo de hibernação que se instala. Um mecanismo de poupança de energia. Tantas vezes prenúncio de boa mudança.
Para os mais precipitados, esta letargia precisa de um nome, de um diagnóstico, de uma cura. Apressam-se explicações, que alguma coisa há de ser. Quase ficamos proibidos de apenas entristecer, de esperar nesse doce balanço que carrega baterias. Deve ser do emprego, das férias, da chuva, do dinheiro, da mãe que está doente. Desta vida que não tem sentido. Embora nunca tenha. E se lho damos à força, nas nossas leis de sempre, logo ele se retira, para voltar a surgir, sozinho, sem mais, só porque sim, com novas regras.
Não há nada a fazer. Há que respeitar. Como se respeita um animal que recolhe à toca para o inverno. Por ser assim que é. E pronto. Corrigir este estado de espírito alterando coisas cá fora poderá ser tão tolo como querer animar um urso que, mais lento, se vai preparando para os meses frios.
Às vezes estamos apenas cansados. Não sendo por nada. E isso está bem. Não percamos pois a oportunidade para sossegar nesse desânimo. Que nos dá tempo. E calma. E paciência infinita para ver com olhos de ver. Para que a antiga pele se quebre e destaque. Na certeza de que sairemos naturalmente ilesos, como também renovados, vigorosos, e, sem dúvida, mais sábios, porque mais humildes, porque mais capazes de aceitar.
Respeitemos o tempo de amainar velas, soltas no marasmo de uma reflexão pausada. Introspetiva. Autónoma. Deixemos que a natureza faça a sua purga e nos renove alma e força.
Bom descanso, bom proveito!
Gonçalo Gil Mata
LET IT FLOW