DIAS VOID
ARTICLES • 02-09-2015
DIAS VOID

Torre de Moncorvo, PORTUGAL


 

 

Há dias assim. Um filme alheio. Cenas dispersas, por aqui e por ali, aos tropeções, empurrado pelas horas fora, à espera que algo aconteça, mas de cabeça baixa, sem olhar, não vá alguém dar por mim e chamar. Espero que passe o tempo, e, como se usasse uns óculos indelevelmente embaciados, tudo turvo, pouco ou nada vejo, nem quero.
 
 
É um não apetecer, sem sequer ser nada de muito declarado. Insistindo, então está bem, pode ser. É como se pudesse ser o que quer que seja, quero lá saber. Nem estou contra, nem zangado, nem nada disso. Isso exigiria demasiada energia. Apenas pronto, é o que é, um nada. Chamo-lhes dias void. Isto é, sem retorno.
 
 
Nem seriam particularmente maus não fosse uma ligeira sensação de que estaremos quem sabe a desperdiçar tempo ou coisa assim. O pior é se num destes dias essa estranheza nos desata a resolver o mundo, deus meu, isso é que nos mete em trabalhos... Um dia void tem que ser respeitado na sua nulidade, sob pena de nefastas consequências se apoderarem dos dias seguintes, quando, passado "o trovão", avaliamos estragos.
 
 
Mais vale estar quieto. Um dia void deve ser saboreado no seu vazio intrínseco. E, talvez quem sabe, por azar ou sorte, algum tijolo acabe corretamente colocado nessa grande construção que projetamos para a vida. Mas que seja por mérito de uma certa inércia, nada mais.
 
 
Sei que amanhã é outro dia. Provavelmente diferente. Essa é uma segurança que me sossega. Por hoje, deixo-me não ser. Afinal, todos temos direito também a, de vez em quando, não existir.
 
 
 
 
Gonçalo Gil Mata
 
1 comment
Rita Gil Mata
"Preguiça, este lento talento de vazarmos tristeza..."

Ary dos Santos.
in 2015-09-02 11:36:27
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