Chefchaouen, MOROCCO
Recentemente, ouvi em conversa: "Dá muito trabalho e é preciso estar muito atento para garantir que, à medida que o tempo passa e envelhecemos, não nos arrependemos de não ter feito as coisas de maneira diferente."
O meu interlocutor mencionava o facto um pouco como quem carrega um fardo pesado. Inevitável missão, a sua, de zelar afincadamente por não dar passos em falso, por escolher sempre bem. No fundo, um esforço sério em preocupar-se, diariamente, constantemente, para que, no fim, possa sossegar na ideia de que fez tudo ao seu alcance para levar uma boa vida. Compreendi o discurso de vésperas de aniversário. Sem qualquer juízo de valor, tudo aquilo me lembrou da clássica questão das insónias...
Um certo cliente meu, atrapalhado que andava com insónias, sai da consulta com uma receita muito clara que o médico lhe deixou: "você não pode passar a vida a pensar nas insónias, porque isso só piora a coisa". Então, vem ele para casa, a ruminar com grande concentração: "não posso pensar em insónias, não posso pensar em insónias, não posso pensar em insónias...".
Eu acredito que a analogia é perfeita. Uma vida passada em eterna preocupação para não ter arrependimento futuro, pode bem dar como resultado o que frequentemente ouvimos aos velhinhos dizerem: "olhe, se pudesse andar para trás no tempo, não me preocupava com metade das coisas com que me preocupei. É a única coisa de que me arrependo: ter andado toda a vida a ver se não me arrependeria mais tarde..."
A certa altura, disse ao tal senhor das insónias que ele ia de facto passar umas tantas noites da sua vida em claro. E pronto. E sim, que também haveria de obcecar com o tema nalguns dias, o que iria piorar as coisas. Sim, isso também lhe iria acontecer alguma vezes, sem dúvida. E pronto. Um x número de vezes. Número esse que está lá. Para ser digerido. Para ser aceite. Para ser integrado na sua existência como um dado do universo. Como quando chove, num dia em que preferíamos que fizesse sol. E pronto.
Da aceitação nasce disponibilidade para deixar fluir. Nascem noites bem dormidas. Porque não interessa assim tanto se vai para a esquerda ou para a direita. Não interessa assim tanto se chove ou faz sol. Paradoxalmente, é quando parece mesmo que sim, que faria toda a diferença, que tentamos interferir no equilíbrio da máquina e corremos o risco de complicar o embaraço do novelo. Puxando com força as pontas, cegando nós. Ensinados a fazer, a mexer, a atuar, parece que nunca treinámos sossegar, deixar correr, deixar reequilibrar.
Concordo que devemos sentir as chamadas naturais para o movimento, sabendo respeitar a necessidade de mudança quando assim é devido. Mas é igualmente importante largar os comandos de quando em vez, para dar espaço para que o acaso e o inesperado e o não planeado façam parte, em certos instantes, nascidos de uma disponibilidade e de uma intensidade de entrega que só está ao alcance de quem compreende que o arrependimento também faz parte da vida. E pronto.
Gonçalo Gil Mata
Andamos a praticar mindfulness ;) Aceitação é uma atitude fundamental na vida.
Conforme um sábio professor meu da AESE (Prof. Raul Diniz) me ensinou: «um plano é importante mas só serve para vermos o quanto nos afastamos dele».
As coisas incríveis que me aconteceram na vida apenas por me «despreocupar» e deixar fluir.