HOJE NÃO PERDI A CARTEIRA!
ARTICLES • 21-01-2015
HOJE NÃO PERDI A CARTEIRA!

Corumbá, fronteira BRASIL/BOLIVIA


 
 
Hoje não perdi a carteira. Estava convencido que sim, mas afinal não. E, de repente, é mesmo bom vê-la. Todos os dias a vejo sem sentir nada disso, mas hoje vê-la é como se anulasse a trabalheira e as horas de ter que clonar tudo aquilo. Necessidade que nunca existiu, repare-se, porque nunca a perdi de verdade. Mas imagine que tinha sido a sua, e entenderá o alarme...
 
 
Engraçado como estas meras hipóteses bastam para trabalhar uma noção psicológica de prazer por ausência de desprazer, sem que nada tivesse acontecido no mundo real.
 
 
Penso que esta é uma fonte de prazer limitada, mas ainda assim interessante de explorar. Quero dizer: só podemos aldrabar o processo até um certo ponto, parece-me. Se pensar nisso, certamente está bem feliz por não estar doente (espero sinceramente que não esteja). Já viu como é bom não ter dores horríveis ao engolir de tão inflamada a garganta? Já viu como é bom não ter aquela sensação no corpo de ter levado uma valente sova? Ou por exemplo como é bom não estar com uma dor de dentes atroz? Por nenhum acidente ter acontecido hoje com a sua família? Ou como é bom o seu país não estar em guerra? Por nenhum tsunami se ter abatido sobre nós?
 
 
Visto deste prisma, tanta gratidão fica por expressar todos os dias quando, mais uma vez, não nos desabou o céu em cima... (e que amanhã não seja a véspera desse dia!)
 
 
Concordo que não é um tipo de pensamento que vá longe. Porque a rotina rapidamente o desfaz em pedaços. Hoje convido-o a estar grato por todo o mal que não lhe aconteceu, e amanhã isso volatilizou-se por completo. Tudo bem, é normal...
 
 
Em todo o caso, hoje, confesso: como é bom não ter perdido a carteira!!!...
 
 
 
Gonçalo Gil Mata
 
 
 

 
 

I DIDN’T LOSE MY WALLET TODAY!

 

Today I didn’t lose my wallet. I was convinced that I did, but in fact I didn’t. And, suddenly, it was really good to see it. Everyday I see it without feeling none of that, but today to see it was like all the work and the hours spent on making the duplicates of all the stuff it contained were dismissed. A need that never existed, make note, because I never truly lost it. But if you imagine the missing wallet was yours, and you’ll understand the alarm...

 

It’s funny how these mere hypothesis are enough to work on a psychological idea of pleasure motivated by the absence of displeasure, without a thing ever having happened in the real world.

 

I think that this is a limited source of pleasure, but still an interesting one to explore. I mean: it seems to me that we can only cheat the process until a certain point. If you think about it, you’re certainly very happy you’re not sick (I sincerely hope you’re not). Have you thought how good it is not to feel horrible pain when swallowing because of an inflamed throat? Have you already thought how good it is not to feel the soreness in your body like if you’ve been beaten up? Or for instance how good it is not to feel an atrocious toothache? Or because today no accident has happened to any of your family members? Or because your country isn’t at war? Because no tsunami hit us?

 

From this perspective, so much gratitude lacks to be expressed everyday when, once more, the sky didn’t fall on us... (and may today not be that day’s eve!)

 

I agree that that’s not the kind of thought that tends to go very far. Because our daily routine quickly rips it into shreds. Today I invite you to be grateful for all the bad things that didn’t happen to you, and tomorrow that will be entirely gone. And that will be OK, it’s normal...

 

Either way, today, I confess: how good it is not to have lost my wallet!!!...

 

Gonçalo Gil Mata

 

3 comments
filipa
Essa é mais uma das razoes para dar graças todos os dias, em vez de pedir mais e mais!!
A minha filha de 14 anos também passou por um processo de doença, uma semana inteira vomitos diarreia dores etc... e ontem acordou bem disposta sem dores e disse-me: Mae vamos sair temos que comemorar, é o primeiro dia que me sinto bem!!!!
in 2015-01-25 16:33:37
Rita
Curioso este tema. Lembro-me bem em pequena, devia ter 9 ou 10 anos, ter tido uma gastroenterite enorme. Daquelas mesmo medonhas. E enquanto estava deitada, em agonia, tentando não mexer nenhum músculo, imaginava como era quando não sentia dor nenhuma. E pensei, nesse momento, que tinha de prestar muito atenção da próxima vez que não sentisse dor na barriga para que me fosse fácil lembrar-me desse momento. E para me alegrar ao vivê-lo, porque isso significava que já tinha acabado aquele tormento. Desde aí fiquei com um hábito meio estranho de pensar, de longe a longe, " que bom que hoje não me dói a barriga". Hoje tenho 33 anos e ainda faço isso, mas acho que nunca tinha contado a ninguém esta histórianem nunca lhe tinha dado tanto sentido :)
in 2015-01-21 18:09:46
Ariana Barros
Sim, há não acontecimentos que merecem a nossa (nem que rápida) gratidão, mas pesam tão mais os acontecimentos (e duram tão mais as dores).
in 2015-01-21 17:39:30
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