QUANDO NÃO ME APETECE
ARTICLES • 10-05-2016
QUANDO NÃO ME APETECE

Kardamyli, GRÉCIA


 

é quando já não me apetece. vou quase a fazer mas afinal não. por não valer a pena. é aborrecido. sem interesse. não me empurrem, que não vou. não tenho forças para desperdiçar nisso, nesse pequeno gesto, nessa atenção, nessa rendição. rendo-me a outro lado. ao ficar. ao quedar-me em sossego. vomitam-se-me as palavras, numa diarreia de purga, por nada apetecer. esvazia-se o sentido. esfuma-se a razão de ser. abandonam-me todos os motivos que me seguraram até aqui. some-se a intenção.
 
e agora? e então? já que nem a reles consequência dos meus não-atos parece espicaçar esta não-vontade persistente. tudo parado, tudo equilibrado no vazio de um quase nada. poiso seguro embora nada pacífico, por me sentir em falta. não sei estar. embora esteja sempre, irrevogavelmente, em permanência. com ou sem vontade, estou sempre. a vida chama-me e eu mando dizer que não estou, mas estou. mesmo em negação constante estou sempre. sem escapatória. refém de um todo opressor, claustrofóbico.
 
não há como explodir com tudo isto, apenas escolher o caminho menos penoso para prosseguir com os passos, neste lento e contrariado arrastar de pés, agastado, quase inerte, sem o ser. no mínimo esforço que garante o menor esforço possível, já que um nada exagerado acaba por custar ainda mais.
 
este pouco que me move, e que raramente espreita como ténue sensação de justificação, o que é isto? que vida se resolve por aqui? não haveria que haver motivo para tudo isto? que cinzento se instalou por dentro!... não há cor. há sobrevivência, há uma moribundice desassosegada, mas não há vida. esbatem-se uns dias nos outros, já não fecha o ciclo do que foi para o que aí vem. tudo é, em cinzento pálido, num degradée cada vez mais ténue, cada vez com menos sentido, sem significado. embora tenha que ser. 
 
e tudo ter que ser é tão chato!... algures acabarei por ter que comer qualquer coisa. mesmo sem sentir fome verdadeira. arrasta-me esta essência inata de uma existência vazia, empurrada. não sinto. apenas sou, sem querer ser.
 
 
 
Qualquer um tem a capacidade para gerar estados depressivos. Equilibrados e estáveis, prolongados. Ajudar passa antes de tudo por compreender. E é difícil compreender para quem está de fora. Para quem quer empurrar alguém do buraco para fora, às vezes acabando por empurrar para baixo um pouco mais.
 
Todos temos a capacidade para gerar estados de inércia, se esse é o filme que passa no nosso cinema interno. E saber que é apenas um enredo, de entre muitos possíveis, e que todos temos também uma tendência inata para a saúde, é o primeiro passo para nos deixarmos voltar ao caminho natural, sem pressão. É a ausência de pressão, a ausência de esforço para se ser melhor, mais adequado, mais assim ou mais assado, é na aceitação de se ser como se é, depressão incluída, que podemos vislumbrar que não é necessário obter autorização para sermos diferentes do que achamos que deveríamos ser.
 
É aí que nasce espaço. Para refletir. Para curar.
 
 
 
 
 
 

Gonçalo Gil Mata

 


 

 

 

 

 

 

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1 comment
Ana
Às vezes ajudar passa não por tentar puxar para fora do buraco, mas por saltar lá para dentro. Se já lá estiveste, já conseguiste sair uma vez e o caminho feito com companhia é mais fácil.
in 2016-05-11 08:06:11
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