SUCESSO AO REVÉS
ARTICLES • 19-08-2015
SUCESSO AO REVÉS

Porto Seguro, BRASIL


 

 

O que pensa quando pensa num incrível sucesso? Que imagem lhe vem à mente? Um escritório no topo de um edifício em Nova Iorque? Um assento à cabeceira de um conselho de administração? Um mar de likes em cada um dos seus posts? Fotos regulares de países exóticos do outro lado do mundo? Um carro topo de gama? Entrevistas na televisão? Sair na Caras? Uma conta bancária recheada? Prémios de reconhecimento? Muitas pessoas a quererem pedir a sua opinião para decisões importantes? Uma casa saída de um filme do James Bond? Jantares de aniversário com 50 pessoas à mesa?

Trabalhar sucesso não é fácil. E não é fácil essencialmente porque as imagens que estabelecem o estereótipo do que consideramos sucesso não estão, em muitos casos, fundadas nos aspetos que mais valorizamos interiormente. Ora, quando assim é, quando é oca essa imagem que vem dos filmes, não se completa o ciclo motivacional que sempre nos alinha a envidar esforços para o que é internamente mais valioso.

Sobre este tópico, vem-me sempre à mente a frase de Jack Higgins, e que também escolhi para introduzir o último capítulo do meu livro: "I wish someone had told me that, when you get to the top, there's nothing there."


É normal - no sentido estatístico da palavra -, embora não muito natural, assistirmos a uma corrida pelo mundo do formato. Pelas evidências que as pessoas de grande sucesso parecem exibir. Quase esquecendo que lá chegar é um caminho longo. Jovens executivos, mal saídos da faculdade, diretos ao MBA, a quererem retirar o stress do seu public speaking, desejando a presença calma e serena de alguém com 40 anos de experiência. Querem ser líderes ao primeiro livro que lêem, sem o mar de asneiras que os grandes líderes têm no seu currículo. Bloggers acabados de nascer a reclamarem a fidelidade que alguns conseguem com muitas muitas semanas de entrega de valor. Jogadores talentosos e promissores, que com 18 anos querem logo na sua primeira final importante a calma dos melhores do mundo. Cantores dos Ídolos, perfeitos amadores, a exigir-se a constância de um profissional com 20 anos de carreira, ... poderia dar mil exemplos...

Parece-me - e é só uma suspeita - que cada vez mais queremos o título, o carimbo, a medalha, muito antes de os merecermos. Queremos o baile de finalistas ao completar a escola primária!


Sucesso quase sempre leva tempo e dedicação. E, quando não leva, desaparece igualmente depressa. Verdadeiro sucesso parte do valor, do contributo, não parte do estrelato. Isso vem depois, se vier. É uma consequência de acreditarmos suficientemente em que algo que sabemos fazer poderá ser útil a alguém. Nem sequer chega gostarmos do que fazemos. Claro que é uma sorte formidável poder juntar as duas - ser útil e também prazeroso, mas muitas vezes não calha assim. E tudo bem na mesma.

A melhor forma de aceder a um nível de sucesso sustentável, é entregar valor, sistematicamente, ao nosso melhor nível. Não uma, não duas, mas um milhão de vezes! E isso só é possível quando o talento vem de dentro. Não do Ego, mas do Contributo. Não da vontade de ser alguém, mas da vontade de querer ajudar. O mundo está sedento de valor, e, havendo o mínimo de visibilidade, acabará sempre por ir buscá-lo por um dos seus múltiplos tentáculos, mais cedo ou mais tarde. Ora, é justamente isso que é ter sucesso: encaixar numa cadeia de valor com sentido, justificada pelo valor em si, pelo retorno que gera.

A pior combinação continua a ser, quanto a mim, a procura do poder, do reconhecimento, da dimensão, do impacto, não a partir do valor, mas diretamente a partir da forma. Sim, hoje em dia há fenómenos virais mas... se pensarmos bem, os blogs que seguimos, os autores consagrados que lemos, as bandas musicais que realmente ficam para a história... nada disso se fez do dia para a noite, num simples fogo de artifício de encher as vistas.

Digo eu, saibamos suar para colher. Não uma, não duas, mas um milhão de vezes. Não queiramos pôr a carroça à frente dos bois. Substrato. Valor. Contributo. Qualidade. Paciência. Perseverança. E, sim, alguma sorte ajuda. Esses são os ingredientes que, talvez, um dia mais tarde, quem sabe, mas não obrigatoriamente, poderão gerar likes e golos e discos vendidos e tudo o resto. Mas vindo de dentro. Não ao revés.

 

Gonçalo Gil Mata

 

3 comments
Pedro Meneses
Pois é, Frank Lloyd Wright projetou algumas das suas mais belas obras aos 60 anos! É preciso paciência e foco constante.
in 2015-09-19 22:38:00
JMMadureira
De facto, não diria melhor...
Sinto-me orgulhoso por te compreender porque, de facto, tens uma inteligência substancialmente acima do normal!
A materialização do conhecimento teórico é (sempre!) mais difícil.
in 2015-08-20 11:44:56
Carmen
O Jack Higgins limitou-se. Ele achou que aquele era o topo. Mas não...havia muito mais a fazer, a ensinar talvez... ele é q não quis mais (ou o tentáculo). O fim ou a continuação da estrada depende de nós.
in 2015-08-20 04:16:59
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