Imitek, MOROCCO
"I wish someone had told me that when you get to the top, there's nothing there."
Jack Higgins
Não a vemos, mas está lá. Uma parede, tão sólida quanto invisível. Uma teia que nos amarra os pés. Uma lama movediça que nos impede de nadar. E embora esbracejemos com força, movemo-nos a passo de tartaruga. Tudo custa. O avanço é parco, ou nulo.
Que se passa? De que é feita esta resistência tão oculta quanto palpável? Terá o terreno ficado mais íngreme? Estarão a esgotar-se as forças, agora tão perto de chegar? Não era para cortar esta meta que tanto tempo e energia investimos?
Quero a sua ajuda para mudar de emprego. Quero a sua ajuda para me divorciar. Quero a sua ajuda para publicar o meu livro. Quero a sua ajuda para terminar a minha tese. Estou decidido, sim, claro que tenho a certeza de que é isso mesmo que quero. É só que não me mexo e não percebo porquê.
O problema dos objetivos, é que ocultam uma promessa impossível. A promessa de atingir o que nunca se perdeu. E no meio, está, claro, e sempre o ego. O grande Sr. Empecilho, no qual tropeçamos infindavelmente. O problema dos objetivos, é que os queremos para nos sentirmos adequados, elegíveis, aceitáveis, merecedores, "normais".
Já passaram por este planeta um número estimado na ordem dos 200 biliões de indivíduos (sapiens sapiens aculturados, como eu e o leitor). Pessoas que tiveram a sua vida muito própria, diferente de todas as outras, com memórias, traumas, medos e esperanças muito particulares, e vivências muito únicas, embora certamente partilhando alguns pontos em comum, nomeadamente o mesmo sol a nascer todos os dias. E mesmo com toda esta diversidade evidente, é notável como lutamos contra a nossa identidade própria, sempre tentando obter medalhas e provas que nos façam ascender a esse estatuto de segurança de ser alguém como deve ser. Sempre lutando contra as nossas supostas imperfeições, que melhor seriam vistas enquanto características.
Pois é precisamente quando lutamos por um objetivo à procura desta auto-validação, que mais tropeçamos nessa barreira invisível. É por estar em causa o nosso ser, a nossa identidade, quem somos, que se torna tão intolerável a dúvida de chegar ou não chegar. Tão difícil a gestão de expectativas de sermos ou não capazes. Tão intolerável o sofrimento de não sabermos se vamos resistir, caso o resultado seja negativo, caso alguém não goste, caso falhe, caso não consigamos. Terão pena de mim se fracassar? Deixarão de gostar de mim? E se conseguir e for um sucesso, o que quer isso dizer de mim? Como integrar essa realidade se realmente eu for brilhante? E se depois não puder repetir o êxito? E se for só mais ou menos? Sairei desiludido? E o que pensarão os outros? Ai, que confusão...
Este processo deve seguir sozinho, naturalmente. Se lhe damos muita importância, pode chegar um ponto em que tudo se torna preferível à dúvida. Então vem o clássico paradoxo de auto-sabotarmos o esforço, por se aproximar a meta, por se aproximar o ponto da validação, onde tudo pode acontecer. Carregamos travões a fundo.
Sim, podemos empurrar e fazer mais um esforço e mesmo falhando as pernas, rastejar até passar a meta. Tenho mais que provas de que isso é possível, e às vezes o único caminho possível. Mas, havendo oportunidade, prefiro mil vezes levar a pessoa a compreender a sua própria resistência. Aprender a dar-lhe ouvidos, embora não lhe passando o volante. A compreendê-la na sua lógica própria, ainda que certamente absurda na aparência. E entender acima de tudo que estes bloqueios se dão a um nível muito mais fundamental que a mera intelectualidade consciente que muitos ingenuamente parecem acreditar ser a única coisa que manda no seu ser...
Depois acabamos por chegar, e não está nada lá. A vida corre como sempre e nem compreendemos porquê essa núvem tão negra que pairou tanto tempo sobre as nossas cabeças. Compreendemos que a aposta era a feijões. Que o que somos, está validado por natureza, na sua unicidade. Que a nossa identidade é uma consequência, não um objetivo. Que viver alinhado com a serenidade de escutar os nossos valores mais intrínsecos é mil vezes mais importante do que nos orientarmos a objetivos artificiais, e tantas tantas vezes é esse o grande truque de atingirmos feitos impressionantes.
Humildade para aceitarmos quem somos, tranquilidade para ouvirmos os nossos medos, alinhamento para acedermos a movimento fluído, é o que recomendo a quem está com dificuldades em cortar a meta.
Brilhante.