DESISTI DE SALVAR O MUNDO
16-09-2016
DESISTI DE SALVAR O MUNDO

Salinas Grandes, ARGENTINA


 

Sinto que desisti de salvar o mundo. Não propriamente por estar desesperançado, ou por me faltar energia, não é bem isso. Na verdade, acho que ainda tenho o meu habitual reservatório de combustível intacto. Nesse campo, sinto-me como sempre me senti: capaz de dar mais uma volta ao mundo, ou empurrar o próprio planeta, se preciso fosse. E é justamente esse o ponto: se preciso fosse. O que mudou, e isto é difícil de explicar, é que neste momento não vejo qualquer razão para salvar um mundo que não precisa de ser salvo.
 
 
As pessoas estão, como sempre estiveram, e provavelmente sempre irão estar, contentes, contentes, entusiasmadas, deprimidas, tranquilas ou angustiadas. Estão bem ou têm dificuldades. Com o dinheiro, com o negócio, umas pedem ajuda, outras não. Algumas imaginam fantasmas, outras bichos, ou mãos sujas e aquela ali acha melhor não sair de casa, porque lhe pode desabar o céu em cima, embora todos saibamos que amanhã não será a véspera desse dia.
 
 
 
Todos vivem, e tudo flui, e eu vou dando, aqui e acolá, a minha natural achega, quando a pedem, simplificando alguns processos mentais, e até mesmo, às vezes, provocando transformações bastante significativas e aparentemente positivas nas suas vidas. Um pouco como uma grande chuvada pode mudar radicalmente a paisagem num qualquer terreno de cultivo do alentejo. Aparentemente positiva, mas sem mérito. Bem como sem culpa quando tudo seca.
 
 
 
 
É como se eu fizesse mais parte do todo. De um todo que compreendo e aceito e que é perfeito tal como está, tudo incluído. E em todas as secas e em todas as inundações do mundo, a chuva continua a fazer o seu papel, sem culpa ou mérito. Como sinto hoje que o meu papel se cumpre, sem culpa ou mérito. E sinto que continuará a fazer-se, mesmo se a vontade de corrigir e alinhar todas as mentes do mundo tenha perdido por completo todo o sentido.
 
 
Deixei de ter o sonho de controlar os céus e as suas nuvens. Choverá quando chover, e haverá seca quando assim calhar. E está tudo bem. Eu, nuvem passageira, choverei também quando assim suceder. No pequeno quintal de algumas mentes, e isso será bom, quando o for. Talvez também outros quintais maiores acabem por também querer que eu lá chova, quem sabe... Já não sendo esse o objetivo. Sem que isso diga mais de mim do que um nevoeiro matinal diz do verão. E, sem mérito ou culpa, nada há a corrigir.
 
 
 
(suspiro) Há paz neste pensamento.
 
 
 
 
 
 
Gonçalo Gil Mata

 

2 comments
Paula
Gonçalo...sem saber como terminarias o texto...Paz, foi realmente o que senti. Parabéns pelo teu processo.
in 2016-09-16 11:13:07
Cláudia
Quem me dera! É difícil resistir ao pensamento de que se tivesse o número do São Pedro já dominava a metereologia!! Ninguém gosta de chuva...
in 2016-09-16 10:02:24
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