TRAMBOLHÕES PELO CAMINHO
13-11-2015
TRAMBOLHÕES PELO CAMINHO

Blue Lagoon, ICELAND


 

 

A tristeza é ladra. Rouba-nos o sal e o tempero. Escurece-nos o sorriso. Pesa no olhar. Tira-nos a coragem de aparecer sem capa. É um sufoco quase confortável. É distância, recolhimento e proteção. Estar triste é um pedido de abraço suspenso. 
 
 
De onde vem a tristeza? Onde fica essa torneira? Onde está a fonte, a origem?
 
 
Podemos procurar a fórmula nas condições cá fora. Mas a tristeza nasce de dentro. De um pensamento. De um espírito ferido. A pedir resolução e cura. E pode aparecer sem aviso mesmo quando muito da nossa lista de objetivos supostos já cá canta. Não há proteção que chegue. Não há vacina garantida. Porque a tristeza, como o medo, e a insegurança, existem dentro de nós em potência. Ativam-se por um mero pensamento, que quer nascer, arranjando alguma desculpa aparente, mas cuja verdadeira natureza é a do caos mental de onde brotam todas as emoções. De uma aleatoriedade que não devemos desafiar, nem contrariar, apenas aceitar.
 
 
Estar triste não é bom. Mas só se torna um verdadeiro problema quando achamos que não podemos estar tristes. Quando achamos que é preciso resolver. Quando queremos resolver uma coisa que é apenas um facto. Caindo nessa fácil armadilha, podemos bem dar-lhe a energia de que precisa para se suster. 
 
 
Com treino, podemos tornar a tristeza num hábito. Mas criar esse hábito de ficar triste exige atenção, manutenção, esforço para segurar esse estado, para não nos distrairmos e sem querer dar uma gargalhada mais solta. Sem intervenção, deixando seguir o seu rumo natural, estar triste é um relógio que perde corda quando chega o momento da corda terminar. E não há cordas infinitas. Só cordas realimentadas. Normalmente por medo. Medo de levantar outra vez vôo, porque do alto o tombo dói muito.
 
 
Tudo tem o seu tempo. Maturado que esteja o momento, chegada a altura de seguir viagem, há que largar o balão, voltar a condimentar o repasto, reampliar sensações e deixar regressar a coragem de aparecer como somos. Infantilmente curiosos para saber o que vem a seguir na rifa. Sem qualquer garantia, note-se bem, de que não voltará acontecer igual ou pior. Porque de facto pode, e se calhar vai mesmo acontecer outra vez. É só que, nos entretantos desses momentos, há uma coisa única e singular a que chamamos vida e que seria pena não aproveitar viver. Venham, pois, as caneladas, que cá estaremos, sempre prontos a mais um jogo.
 
 
 
Gonçalo Gil Mata
 

 

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